quinta-feira, 10 de maio de 2007

Estação

Eu até gosto do inverno.

Dos dias frios com os céus cinzas cheios de adeus. Aquele vento da tristeza incubada te levando para qualquer lado mesmo. Você fica chutando pedras pelo caminho e levanta a gola do casaco.E o vento gelado te sopra que a vida é mesmo assim sem pressa de se acabar, cozendo aflições e saudades eternas. E de repente uma música.

E você pára pra acender um cigarro. Eu até gosto do inverno.

Porque parece que é assim mesmo, a alegria da gente é pequenininha mesmo e a gente tem que esperar até acabar. E cada olhada para o lado que você dá é uma sentença de morte. E todo o dia parece desabar sobre a gente, ou ainda parece sair de dentro assim como nosso olho criasse tudo que se vê e lá dentro a única coisa que há é uma indizível imensidão criadora de dias. E quando você olha para suas mãos e elas não fazem sentido, pra calçada e ela não faz sentido, suas memórias também não. Nada faz e você olha para o céu e ele é da cor do seu coração.

Eu gosto do inverno porque a dor parece tao pertencente da gente que é ela quem faz o tempo correr devagarzinho, doendinho. Vira ali a dor amiga parceira, e você entende que é mesmo pela vida inteira que você carrega, por mais que se gaste os sapatos.
Eu até gosto do inverno, não é só escolher a música certa.
É saber com certeza que você construiu tudo aquilo que existe. Que as verdades são coisas de verão, que a saudade é que é rio perene. Seu coração parece então uma ampulheta gota-a-gotejando toda aquela coisa, bem miudinho, pra cair no tanque de areia do sofrer.

Cada baforada que você solta forma uma imagem monstruosa que você não estranha, e ela pisca pra você. O inverno é mais perto do inferno, e isso não é só um jogo de palavras. O inverno combina com um coração gelado. O inverno é mais perto do segredo damorte. O inverno é o lugar do não-amor (por isso eu me sinto em casa)

As ondas voltam pro inverno, as praias ficam desertas. E existe areia ali pra secar um pranto. O inverno congela as lágrimas. O inverno entra pelo nariz da gente e sai pela boca na forma de canção e pelos olhos na forma de choro rasgado.

E o que dizer daquele azul pálido e triste que fica boiando no céu? Azul-cor-de-amor. Um azul gasto, de que já não quer mais ser azul, e pega na mão do nada pra virar não-cor. Vai embora logo logo, igualzinho ao amor. Dizo nome do azul enquanto ele desce.! Ele foge, se esconde. E depois fica chorando o di'inteirinho e morre nas saudades. O azul-desilusão.

Do inverno eu gosto. Diz pra gente que a gente morre mesmo, e até do que vai. - saudadee tristeza.
O inverno grande, vem de dentro.

2 comentários:

Anônimo disse...

lindo!

.mãos coloridas disse...

os invernos e o sertão.
é tudo dentro da gente.